Apólogo

Apólogo

"O velho Torquato dá relevo ao que conta à força de imagens engraçadas ou apólogos. Ontem explica o mal de nossa raça: preguiça de pensar.
E restringindo o asserto à classe agrícola:

- Se o governo agarrase um cento de fazendeiros dos mais ilustres e os trancasse nesta sala, com cem machados naquele canto e uma floresta virgem ali adiante; e se naquele quarto pusesse uma mesa com papel, pena e tintas, e lhes dissesse:
"Ou vocês pensam meia hora naquele papel ou botam abaixo aquela mata", daí cinco minutos cento e um machados pipocavam nas perobas!... "

(Monteiro Lobato - Cidades Mortas)

terça-feira, 8 de outubro de 2013

A saga Kátia Abreu


É importante fazer uma análise rápida do que é, e para onde vai Kátia Abreu e compreender o que simboliza este ícone - que agrega os maiores latifundiários do Brasil -  à conjuntura atual, aos movimentos sociais do campo e ao governo bem como suas opções e articulações que, possivelmente alterarão os caminhos da economia do Brasil.

Sem querer tocar no assunto posicionamento político, violações de direitos humanos, crimes ambientais, exploração de trabalho e a lógica do agronegócio que expropria a cultura familiar camponesa e afasta dia a dia a possibilidade de uma Reforma Agrária no Brasil, vamos às contas lógicas:

Kátia Abreu: Senadora de Tocantins e representante do Agronegócio, a cara exposta da bancada Ruralista desse Brasil tem a seguinte passagem:

1- Fazia parte do PFL (Partido da Frente Liberal) e quando o partido desconfigurou-se e criaram o DEM, a atual Senadora fundou o PSD (junto à Gilberto Kassab).

2- No PSD, já no mandato Dilma, Kátia Abreu compôs a CNA (Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária - assumindo o cargo de Presidente).

3- Esta semana Kátia filiou-se ao PMDB, convite articulado pelo vice-presidente da República, Michel Temer - o que não agrada a todo o PMDB: Geddel Vieira Lima, hoje um dos vice-presidente da Caixa Econômica Federal, é um dos inconformados. Mas o que mais espanta os otimistas é a seguinte publicação:

Dilma Rousseff teria avisado ao seu vice, Michel Temer, que se o vice-presidente de Pessoa Jurídica da Caixa Econômica Federal, Geddel Vieira Lima, continuar discursando contra filiação da senadora Kátia Abreu ao PMDB perderá o cargo. De acordo com antigos peemedebistas, Geddel teria pedido para a presidente demiti-lo."E ele fala isso abertamente, e falou até para o Michel [Temer]", contou uma fonte do Congresso. ¹

4- Kátia compra brigas: A primeira com uma parcela do PMDB (liderada por Eduardo Cunha) que não quer perder a pasta do Ministério de Agricultura para a suposta candidata e que sustenta que Kátia Abreu age mantendo o partido como aluguel. Permanece influenciando o PSD (deixando seu filho Irajá Abreu no comando) e assim ficaria com "um pé cá outro lá"
A verdade é que mais dois ministérios devem cair no colo do PMDB (Veja em:  http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2013/9/19/psb-devolve-2-ministerios-ao-governo-dilma) e não a toa Kátia é convidada de Michel e Dilmar reforçando a vitoriosa coalizão de PT e PMDB.

Importante frizar ainda quem escolhe quem nessa dança das cadeiras (Veja em:  http://veja.abril.com.br/multimidia/infograficos/quem-escolheu-quem)

São 39 Ministérios com custo de 58 bilhões anuais aos cofres públicos, e pela troca troca de ministros o que percebemos é o verdadeiro balcão de cargos tanto no governo Lula como o de Dilma. Criaram pastas para agregar partidos à base aliada. 

5- Toda esta movimentação talvez soe com ar de normalidade nos dias de hoje e nas articulações e rompimentos propositais, feito entre compadres, mas esta, mais que outras que estão expostas tem significado especial.

Por que?

Os movimentos sociais no último decênio (principalmente os movimentos campesinos) ficaram engessados frente à política da Dilma e Lula, seja pelo chamado descenso esperado graças à política social do Bolsa Família e outros projetos populares, seja pela política macro de "desprezo" à opinião popular mesmo. Esta opção, correlata ao aumento de cargos nas secretarias que abarque os movimentos, cooptando lideranças, é agora o nosso maior desafio.

Dilma cala os movimentos sociais que compõem sua base, o PT nas instâncias estaduais segue a cartilha, oferece a chamada aproximação aos movimentos que por sua vez opta por aguardar quem sabe, uma secretaria que vá auxiliar a melhora de vida dos seus.. Esse aguardo sem fim permeia os dias de quem luta e pouco se constrói. No Brasil, no último governo foram apenas 86 desapropriações.

O que esperar?

É tempo de agitação nas ruas, após as manifestações de junho, estamos frente à Copa do Mundo e o povo provavelmente irá às ruas demonstrar sua insatisfação com o acordo firmado entre governo e FIFA. É hora dos movimentos irem às ruas, proporem o aglutinamento das pessoas em suas causas e reverterem esta situação. Com coragem, sem medo.

Os que ficarem à sombra de Dilma neste período, demonstram a sombra de Temer e logo do Agronegócio de Kátia Abreu.. A conta é simples e o resultado tão delicado quanto o momento que se vive.
¹ - 
http://www.portalct.com.br/blogct/2013/10/03/57263-eduardo-cunha-diz-que-katia-quot-usa-quot-pmdb-como-quot-aluguel-quot-nomeacoes-no-ministerio-da-agr

segunda-feira, 11 de março de 2013

O 8 de março

O 08 de março.

Me lembro muito bem de à esta data, por vários anos, ver meu pai entrar em casa com 3 rosas, para minha mãe, eu e minha irmã. Bonito dia em que haviam mais pessoas vendendo ou dando mesmo flores nos semáforos de Belo Horizonte. Na escola homenageávamos a Virgem Santa e os funcionários nos parabenizavam pelo nosso dia.

Mas eu, e minha irmã, éramos apenas duas crianças, mal sabíamos... o que representa ser mulher. Por estarmos num colégio católico, talvez fizéssemos idéia de que éramos a expectativa da materialização da doçura e beleza, e a contemplação de mulheres históricas fortes, mas imaculadas. Parceiras, mas obedientes, bonitas, mas tampadas.

Crescemos. Cada uma tomou um rumo na vida e em vários pontos divergimos. Mas temos algo em comum: Somos mulheres, sofremos no âmbito de nossos diferentes cenários de vida a flagelação de ser mulher, independente de convergirmos em qualquer debate, e que ironia convergirmos apenas na dor.

Este ano em especial prefiro me abster da minha flor "de direito" com a melhor das intenções de meu pai, também das congratulações quase maquinais dos funcionários de prédios públicos, me abstenho de receber parabens por manter a ordem das coisas como estão.

Falo isso, pois desde que sou criança e observo o mundo, ja ví muita coisa melhorar: As piadas em relação aos negros, caíram em desuso, raros são os que ainda riem. O debate homossexual, graças à bons militantes, têm sido levado em consideração, mesmo que minimamente, há maiores ganhos e respeito.

Mas às mulheres, não.
Não falo aqui de equiparação salarial, ou do avanço da Lei Maria da Penha, falo do dia a dia, da violência psicológica, de piadas, flertes, subjugação, preconceito, exploração, assédio moral e sexual.

Entre compadres da política, política ainda é para homens, e a mulher para futilidade e apelo sexual. É a máxima.

Com esperança, desejo muita força para as companheiras não no 08 de março que é dia bonito de luta, marcha nas ruas e flores, mas desejo força mesmo é no dia 09, quando a vida volta ao normal e somos ainda as vítimas do machismo, dos homens para com as mulheres e da competição das mulheres para com as próprias mulheres, numa rivalidade machista e deturpadora.

Que se perpetue um 8 de março não só para as imaculadas mulheres que nos serviam de referência, mas por todas: As mães, ás estudantes, às realizadas, às juizas, as marginalizadas as putas, as drogadas, as negras, as brancas, as vulgares, as felizes...

À todas que existem dentro de nós e um dia, quem sabe: ÀS LIVRES!!!
 
 

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Nada causa mais horror à ordem


A consagração do belo trabalho da pequena atriz teria outra repercussão caso a mocinha tivesse nascido 2 tons mais clara. Sim. É um fato.

Quvenzhané é negra, e é mulher. E "nada causa mais horror à ordem do que mulheres que lutam e sonham" já diria J. Martí.
A pequena garota talvez esperasse o mundo aos seus pés diante do que representa a celebração do Oscar, mas não, ao longo dos seus 9 anos, ela - e todos os negros - cresceram ouvindo o que os brancos chamam de "piadas", mas é racismo mesmo!
Não seria diferente se no grande dia - assim como
em todos os outros de sua vida - ela sofresse o racismo fantasiado de "piada".

Quvenzhané não seria consagrada simplesmente pelo talento sendo mulher e negra. Com apenas 9 anos foi chamada em público de "cunt" (a pior ofensa da língua inglesa, que à nossa tradução significaria "boceta"), uma forma de adjetivar "de brincadeira, é claro" a mulherzinha negra que virou estrela.

Logo a ofensa foi retratada via twitter e seguida de uma justificativa: Seria apenas uma piada.


Em tempos de tanto apelo à liberdade de expressão (vedada principalmente na máquina capitalista), falar o que se quer só é permitido quando o locutor é um homem branco e a vítima, digo, ouvinte, um negro, ou uma mulher, ou um gay.

Para estes 3 seres, Há sempre o sexismo, o racismo, a misoginia, o ódio e preconceito transvestidos de "piada" de forma a assoprar o que se feriu.

Ando particularmente cansada de piadas. A vida, a dignidade das pessoas, a integridade física e mental não são condizentes com piadas. E ponto.

Quer o mundo conservador queira ou não.

Somos mulheres, somos negros, somos gays, somos transsexuais, somos  a escória da história mundial e ainda assim somos seres humanos cada vez mais capazes, apesar do mundo conspirar contra. Incomodamos.

A pequena estrela de Hollywood incomoda e isso é tudo.

O Papa caiu, negros e mulheres ocupam o espaço dos antigos senhores do patriarcado, na política, na arte, no judiciário.. Bons ventos nos trazem e os Senhores terão de nos engolir!


___________________________

* Segue abaixo a memorável fotografia de Dorothy Counter, primeira mulher a frequentar a escola nos EUA em setembro de 1957, sob deboches e piadas. Qualquer semelhança...





Luara Colpa